Pague um boleto para você todo mês

Esse é o conselho da educadora financeira Vânia Santana para quem deseja organizar os gastos e se livrar das dívidas
7 de maio de 2024 em Edições Impressas, Entrevista

Vânia Santana começou esta entrevista falando da idade. “Não por etarismo, e sim porque me situa no contexto”, justificou. Aos 61 anos e formada em administração de empresas, ela esteve por mais de três décadas trabalhando na área financeira de grandes companhias, como Cargill, DHL e Semco.

Em 2017, Vânia começou a pensar no pós-carreira, ou seja, no que faria depois que deixasse de ter carteira assinada. Foi cursar uma pós-graduação, e o professor a apresentou à formação de coach. Ela abraçou a ideia. Sua primeira intenção era usar a experiência na área financeira para colaborar com pequenas empresas, mas, aos poucos, um novo objetivo foi surgindo: ajudar mulheres negras a construir uma nova relação com o dinheiro.

Neytan S., 17 anos

“Eu conhecia mulheres poderosas, talentosas, inclusive na minha família, que se esforçavam, mas não conseguiam obter sucesso financeiro, porque não sabiam como alcançá-lo.”

Nesta entrevista para o TINO Econômico, Vânia respondeu as perguntas de Neytan S., de 17 anos, aluno do ITB Jardim Belval, da Fundação Instituto de Educação de Barueri (Fieb), falando sobre os benefícios que a educação financeira pode promover.

Por que você decidiu trabalhar com educação financeira?

Quando eu tinha cerca de 38 anos, perdi meu trabalho. Foi um período difícil. Eu ainda não estava com contas atrasadas, mas tinha uma boa quantidade de dívidas e a minha renda reduziu. Eu sempre tive um histórico de ser muito pontual com meus compromissos, então isso me abalou muito. Fiquei pensando no que eu ia fazer para reverter aquela situação. Comecei a tentar várias coisas. Fui dar aula e virei síndica do prédio onde eu morava, embora não gostasse da função, porque garantia a isenção do meu condomínio. E comecei a renegociar todas as minhas dívidas.

Foram dois anos para sanear todo o meu endividamento. Cada conta que eu encerrava, cada dívida, cada parcela que deixava de ser uma despesa, foi virando investimento. Parcelei o cheque especial em 24 vezes e a 25ª parcela virou meu primeiro investimento. De lá para cá, eu passei de endividada a pequena investidora e conselheira informal para minha família e colegas de trabalho. Foi por esse motivo que, no momento do pós-carreira, eu fui buscar qualificação para transformar algo que fazia informalmente em um método de educação financeira.

E por que decidiu focar em mulheres negras?

Eu atendo todos os públicos, mas acabei focando mais em mulheres negras partindo da minha própria história. Eu sou cercada de mulheres muito fortes, começando pela minha mãe, minhas tias. Eu tenho uma irmã poderosa, sobrinhas e primas trabalhadoras, que se esforçavam, que estudavam, mas não tinham sucesso financeiro por falta de orientação, assim como eu também não tinha. Eu não sabia que podia juntar dinheiro, que podia separar um valor. E eu não compreendia que, no primeiro ano, o valor não é muito significativo, mas depois o dinheiro vai rendendo e é transformador.

Quais dicas você pode dar aos jovens para controlar gastos?

Primeiro é entender quais são os seus gastos e qual é a sua renda, seja mesada, seja um dinheiro pontual. É importante ter lazer, comprar roupa, sapato, todas as necessidades básicas, mas é preciso fazer isso dentro da realidade. Educação financeira não é sobre não realizar o que se deseja, e sim a respeito de saber quando realizar e em quais condições. Uma questão é a pessoa ter um estilo de vida superior à renda. É preciso entender que existe uma construção antes da realização. Se no primeiro salário o jovem passar o cartão de crédito para comprar celular, sapato, tênis, o rendimento dele vai estar comprometido o resto do ano.

Também é essencial ter controle sobre os gastos, porque a pessoa fala: “Ah, eu vou sair este fim de semana, vou gastar cem reais”, mas decide comer um lanche, volta de Uber para casa porque ficou tarde e, quando vai ver, gastou 150 reais sem ter intenção. Outra atitude que faz diferença é separar um dinheiro para você. É como ter um boleto todo mês que você vai pagar para si mesmo. Isso garantirá segurança financeira e a realização de projetos, independentemente da renda. Nunca é tarde para começar, mas, quanto mais cedo, melhor.

Do que você mais gosta nesse ofício de educadora financeira?

Eu gosto de ver a diferença que a educação financeira pode fazer na vida das pessoas. Fico muito realizada quando percebo a transformação na vida de mulheres que não conseguiam juntar dinheiro e não tinham patrimônio.

Você trabalhou em grandes companhias na área financeira. Cuidar do dinheiro de uma empresa é diferente de cuidar do próprio dinheiro?

Os fundamentos são os mesmos, mas tem alguns mitos, como o de que o volume de dinheiro faz diferença. As pessoas acham que têm que ter muito dinheiro para começar a investir. Quando se fala de fluxo de caixa, parece que só uma companhia tem fluxo de caixa, mas se gastamos e temos renda, também temos fluxo de caixa. Temos orçamento, temos nossos projetos. A forma como lidar com o dinheiro é a mesma — a diferença é que o dinheiro é de uma pessoa e não de uma empresa.

 Menina com celular. Foto criada por diana.grytsku - br.freepik.com

Já tem cadastro?

Acesse!

Não tem cadastro?

Assine!