


O advogado e executivo Marcelo Behar, de 48 anos, é o enviado especial de bioeconomia do Brasil na COP30, a Conferência das Nações Unidas Sobre Mudanças Climáticas que será realizada em Belém (PA), em novembro. Nesta entrevista, ele falou com os jovens repórteres Rodrigo G., 14 anos, e Carolina G., 10 anos, e explicou o que é bioeconomia, quais são seus desafios e por que esse tema é central para o futuro do planeta.
Se você pudesse explicar a bioeconomia de um modo que todo mundo conseguisse entender, o que diria?
A bioeconomia é um jeito de produzir tudo do que precisamos — para comer, morar, viajar e nos cuidar — utilizando recursos renováveis. Em vez de usar matérias-primas que se esgotam, como petróleo e gás, utilizamos recursos que podem ser produzidos novamente.
Na agricultura, por exemplo, substituímos fertilizantes químicos por bioinsumos, que são organismos que mantêm a plantação saudável. No Brasil, desenvolvemos uma tecnologia que permite aos carros rodar com álcool da cana-de-açúcar, uma planta renovável, emitindo muito menos gases poluentes do que a gasolina. E com os veículos elétricos, encontramos uma solução ainda melhor: eles funcionam com bateria e circulam sem causar poluição.
Qual é o maior desafio que enfrentamos ao tentar equilibrar geração de riqueza e conservação da biodiversidade?
Atualmente, para produzir tudo do que o mundo necessita, geramos, somando todos os países, uma riqueza de 100 trilhões de dólares [em torno de 533 trilhões de reais]. No entanto, para alcançar esse resultado, emitimos 42 bilhões de toneladas de Gases de Efeito Estufa e desmatamos cerca de 10 milhões de hectares de floresta por ano. São números muito altos.
O principal objetivo da bioeconomia é manter a produção desses 100 trilhões de dólares em riqueza, garantindo que todos tenham acesso a alimentos, educação, moradia e transporte, mas emitindo o mínimo possível de gases e sem derrubar nenhuma árvore. Em outras palavras, é uma maneira de não desmatar mais nada e reduzir fortemente as emissões, sem deixar de crescer.
Como transformar a diversidade brasileira em um modelo que beneficie povos indígenas e comunidades ribeirinhas?
A bioeconomia tem vários pilares. Um é a agricultura, outros são as florestas e a sociobioeconomia, que foca no trabalho com comunidades tradicionais, como ribeirinhos, povos indígenas e quilombolas.
Temos que trabalhar com os povos indígenas e comunidades tradicionais, que são responsáveis por assegurar 80% da biodiversidade do planeta. Eles são os verdadeiros guardiões das florestas, pois moram lá há muito tempo e sabem como viver sem desmatar.
Com a bioeconomia buscamos organizar melhor a venda do que eles produzem, pagando um pouquinho a mais e reconhecendo o conhecimento que têm. Isso já é regulado desde 2014, pelo Protocolo de Nagoya. O que temos que fazer agora na COP é explicar bem essas regras e ampliar a quantia que vai para as comunidades tradicionais.
Se você tivesse que escolher entre lucro imediato para o país ou a preservação da Amazônia a longo prazo, o que priorizaria?
Com certeza eu escolheria a Amazônia a longo prazo, porque o lucro vai e vem, mas a vida é muito mais sensível. A Amazônia, sozinha, equivale, em termos de carbono, a tudo o que os Estados Unidos emitiram de 1850 até hoje. Se a floresta fosse totalmente derrubada, o impacto seria equivalente a toda a poluição que os Estados Unidos causaram ao longo da história.
Como cidadãos, o que podemos fazer para contribuir?
Quando compramos, vale prestar atenção: quanto menos plástico adquirimos, melhor. Alimentos frescos da feira são muito melhores do que o que vem em caixinha e fica parado no supermercado por semanas. Toda vez que você compra alimentos frescos, está ajudando muito a bioeconomia.
Escolher carros que poluem menos, verificar se um produto é reciclável e separar o lixo também ajudam. Separar o que é orgânico do que é reciclável faz muita diferença. Orgânico é tudo aquilo que apodrece e não passou por nenhum processo de transformação. O omelete, por exemplo, não é orgânico porque já foi transformado, mas a casca do ovo é. Se você junta tudo que é orgânico em um lixo e tudo que é reciclável em outro e entrega para a coleta seletiva, já está colaborando bastante com a bioeconomia.
Se você pudesse mudar qualquer coisa no mundo para melhorar a bioeconomia, o que seria?
Este é o momento “gênio da lâmpada”. Meu pedido seria: vamos reverter os subsídios. Hoje, os países dão um dinheiro a mais, chamado subsídio, para algumas atividades — e o petróleo ainda recebe muito subsídio. Ou seja, há um monte de dinheiro financiando a poluição do mundo. Eu queria inverter isso. Gostaria que os países começassem a dar mais dinheiro para quem está limpando e regenerando o planeta, não para quem está poluindo.